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mundo
Todas as coisas têm o seu mistério
e a poesia
é o mistério de todas as coisas

Federico García Lorca

Sendo este um BLOG DE MARÉS, a inconstância delas reflectirá a intranquilidade do mundo.
Ficar-nos-á este imperativo de respirar o ar em grandes golfadas.
junho 30, 2008

o 9º Encontro


- foto de Jorge Castro

E pronto! Lá se realizou mais um Encontra-A-Funda, o nono, desta feita por Coimbra e pelo Mondego, acima e abaixo e de todas as maneiras.

Como sempre, como é hábito, como se espera, mas ainda assim tendo o condão de surpreender todos os participantes, o riso alongou os espíritos muito para além da sensaboria dos dias.

Tudo se poderia dizer e quase tudo ficaria por ser dito. Quem quiser saber como é, inscreva-se no próximo. Pela parte que me toca, já podes contar comigo, São!

Entretanto, para despertar os espíritos, AQUI ficam algumas fotos do Encontro.

Afixado por: Jorge Castro (OrCa) / 00:05


junho 28, 2008

por Coimbra e pelo Mondego

Dias 28 e 29 terá lugar mais um Encontra A Funda, que já vai na sua 9ª edição. Encontros saudáveis de gente boa com a cabeça bem arejada, sempre se têm pautado como excelentes convívios, onde se assumem posturas descomplexadas e iconoclastas, aos quais me tem dado especial gozo participar.

Posto isto, o cenário deste encontro é Coimbra e o seu Mondego. Cá lhe deixo um dos meus «poemas descritivos» que amanhã será dito a bordo do barco que nos levará em passeio pelo Bazófias:

MONDEGO

que sossego, este Mondego…
o maior que vem do centro
e que jovem
bem lá dentro
em vale estreito e fecundo
em meandros encaixado
menininho
e já profundo
é chamado Mondeguinho
coitadinho
estrangulado
é assim que lhe acontece
untar-se junto a Manteigas
e cruzar em águas meigas
a Senhora de Asse Dasse

da Estrela até à Foz
passa pela Livraria
e em chegando à Portela
liberta-se da agonia
ganhando alento e outra voz
e lá vai ele espraiado
tão mais largo
enfatuado
a dar-nos não só o arroz
como a esconder-nos pecados
esse Bazófias cansado
enterrando docemente
no aluvião do presente
o mistério do passado

tem filhos – o Dão e o Ceira
o Alva, Arunca e o Pranto
e netos – Folques e Areeiro
de tanto lhe vem quebranto
e uma Cabra o espreita
badalando vida afora
que é só com ele que se deita
fálica ou falaciosa
na estroina que o venera
venérea
bruta
dengosa
de Coimbra a estudantada
que em seu leito se deleita

e em cada curva do rio
uma sereia te espreita
bela
ondulante
difusa
que de segredos é musa
e dos vates se aproveita
quando é por eles adulada

era um Mondego de enchentes
soberbo
bruto
e audaz
hoje traz consolo às gentes
só mimos
e ali jaz
já sem ter aqueles repentes
de zás-trás-catrapás-pás
de pantanas
de correntes
cantado em tunas dementes
mas
no fundo
bom rapaz

ah Mondego
que refego
que bem sabe este aconchego

mas estarás tu contente
por vegetares nesta paz?…

- poema de Jorge Castro

Afixado por: Jorge Castro (OrCa) / 00:29


junho 24, 2008

ficção mais do que científica
ou o hiper-realismo a martelo...

1. Querem apostar em como alguém virá dizer, dentro de alguns dias (meses?...) que o sucesso escolar, no ano lectivo de 2007/2008, se alcandorou a níveis inimagináveis?

2. No concerto das Nações, no ano cheio de graça de 2020, o maior cérebro matemático português espanta a comunidade científica com o seu mais recente e elaborado trabalho de investigação, uma equação que já corre o mundo com o nome de «A Consequência Simplex». Ei-la em todo o seu esplendor e em primeira mão:

1 + 1 = 2 - 20% de IVA (podendo ser de 5% se se partilhar o carro na deslocação para o emprego)

3. 2025, Junho - O presidente do Conselho de Administração de uma empresa chamada Portugal, S.A., reune com o seu quadro executivo, composto por 85 ministros a recibo verde, para discutir o que fazer para a sustentabilidade do país, após a crise aberta com a morte por velhice do último funcionário público contratado, um professor com 108 anos de idade, que acumulava funções de médico, parteiro, condutor de ambulâncias, gerente agrícola e armador de uma frota pesqueira.
*
Exemplo a seguir de lusitano empreendedor ou da aplicação do velho dito segundo o qual só se perdem as que caem ao chão:

Afixado por: Jorge Castro (OrCa) / 23:00




fotografando o dia (106)


nem sempre é feito de sombras algum som
nem de luz tangido o avesso da noite
e se a luz tardia do dia que finda
inicia a cor de beleza fecunda
é porque ela apenas é mais envolvente
tal o ninho ameno de mátrio ventre
que transporta o longe
mas que é perto
sempre


- foto e poema de Jorge Castro


Afixado por: Jorge Castro (OrCa) / 01:06


junho 22, 2008

não percebo nada de futebol...

- Ronaldo jogou lesionado? E já andava com a lesão há meses? Se se entende mal que o Manchester tivesse conveniência em assim o manter até ao final das competições em que estava envolvido, não entendo, de todo, que ele se tivesse mantido como seleccionado português, levando consigo a lesão para o relvado...

- Scolari aproveitou a aura de que a selecção de futebol portuguesa estava ungida para anunciar a sua saída para o Chelsea, colhendo as mais-valias de estar na mó de cima, em função de expectativas geradas, anteriores ao flagrante desaire que veio a ocorrer. Uma vez mais, geriu bem o seu tempo e a sua imagem, usando como trampolim a selecção. Sempre o achei um grande trampolineiro... E aproveitou bem o dinheiro que por cá lhe pagaram.

- Resta a imagem de um bravo Ricardo que conseguiu, por fim e esforçadamente, convencer quem o viu de que, para além de defender grandes penalidades - pobre especialização para 90 minutos de jogo - é um fraco guarda-redes, cujo valor transcendente apenas existiu na obstinação de um treinador com tiques de autismo e incertas certezas.

Ai dos vencidos!... A única consolação nesta descida à realidade é a de que Sócrates deve estar danado. O jeito que dava, agora, mostrar uma selecção de futebol ganhadora como corolário de uma acção governativa que ninguém percebe ou receia, sequer, perceber!

Fica, porventura, a alegria desassombrada de que, se tudo correr de feição, este campeonato europeu poderá vir a ter, na sua final, um confronto Rússia-Turquia. Durão ficará radiante com este alargamento ad-hoc do espaço europeu.

Ainda bem que eu não percebo nada de futebol!

Afixado por: Jorge Castro (OrCa) / 11:30


junho 19, 2008

poesia no ArtShopping, em Cascais - convite
e mais uma de mau feitio

Amanhã, dia 20, pelas 21h30, na Rua Afonso Sanches, em Cascais, uma sessão de poemas no ArtShopping.

Como é hábito, prevê-se a participação dos presentes, num espaço aberto a cada sensibilidade ou estilo e que muito bem entenda partilhar a sua arte.

Eu moderarei a sessão, estimulando essa participação em sucessivos desafios por diversos percursos poéticos. Talvez se fale, principalmente, de mar...

O ArtShopping, sob gerência de Pedro Albuquerque, é um espaço... que só visto! Portanto, o melhor que têm a fazer será mesmo ir até lá. Jantar, tomar uma bebida... Mas tragam, também, um poema e não se esqueçam dos amigos...

*

E, agora, uma coisa que não tem nada a ver com a anterior, mas que aqui deixo com a maldicência costumeira ao bom povo português, do qual faço parte, a bem e a mal, até que a morte nos separe... E mesmo então...

Rigor? Cientificidade? Credibilidade? Não sei! Sei, apenas, quanto me vai custando viver e, daí, estar muito convicto de que a comparação abaixo é digna de algum crédito.

Entretanto, se alguém tiver provas do contrário, diga. Contribuirá, decerto, para a felicidade de muitos, pois nada melhor do que aquele salazarento preceito dos pobrinhos mas honradinhos.


Entretanto, também, viva a lusa selecção, a € 700 per capita e por dia, e os lusos gestores com aumentos de 100%. Componha, cada um dos amáveis leitores, o ramalhete a preceito: chu + t ou l (à escolha) + os = nós-por-cá-todos-bem, equação ainda mais fácil do que a matéria do recente exame nacional de Matemática, a apontar para o INCRÍVEL SUCESSO DA POLÍTICA DO ACTUAL GOVERNO, como já todos esperavam, aliás.

Presumo que a asserção acima não prime pela elegância - o que, eventualmente, me penalizará perante alguns bons pensadores - mas devo confessar que a paciência tem limites e os meus já foram largamente ultrapassados.


Nota póstuma - São 23h30 de 19 de Junho de 2008. A selecção portuguesa de futebol tropeçou na selecção alemã. Lá voltou a desfazer-se o império... O dos sonhos, claro, que até me parece só não haver dinheirinho para alimentar a realidade, já que às quimeras nada lhes falta.

Agora, se eu mandasse, todo o séquito de meninos mal-sucedidos havia de devolver o «guito» imerecido por incapacidade de lograr os objectivos. Ora, pois! E sempre se arranjava margem de manobra para matar a fome a uma mão cheia de portugueses durante uma data de tempo.

No fundo, nada se resolveria, também. Mas, desperdício por desperdício, há algum com melhor proveito do que outro...

Ah... e, já agora, outra coisa: a partir de hoje, sim, é que devem sair à rua as bandeiras, as tarjas e os cachecóis. Em ímpetos de futuro, claro! Porque os pobres que hasteiam bandeiras apenas apoiados nas pernas dos outros, esses já foram, a correr, retirá-las, como se o amor pátrio se lhes tivesse desvanecido em mais um desaire dos futebóis.

Esses têm, de si mesmos e do ser português, a consistência estrutural das amebas.

Afixado por: Jorge Castro (OrCa) / 11:15


junho 16, 2008

um pequeno orgulho partilhado e, logo depois, mais poesia...

O suplemento 'Lletres' do diário asturiano 'La Voz de Asturias', no passado dia 12 de Junho de 2008 (página 3), pela pena de José Luis Campal, refere dois poetas portugueses do século XXI: João L. Barbosa e Jorge Castro.

Orgulho, como é óbvio. Orgulho partilhado com a editora Apenas Livros que, livro a livro, cordel a cordel, vem entretecendo essa renda de bilros contra desatenções e conformismos dos valores estabelecidos.


No próximo dia 18, haverá uma nova sessão de Noites Com Poemas, desta vez tendo como convidado Ernesto Matos.

O tema: Assinaturas - um passeio poético pela calçada portuguesa.

Apareçam. A noite é nossa e mais rica e estimulante com a vossa presença.



Afixado por: Jorge Castro (OrCa) / 23:56


junho 15, 2008

procure-se cultura através das autarquias...

... pois que nem tudo adormeceu sob as bandeiras chinesas do futebol europeu.

Assim, ao correr do fim-de-semana:

- Na Livraria Verney, em Oeiras, no dia 12, lançamento do livro Antologia do Clube de Poetas de Paço de Arcos, pela indesmentível determinação de Maria Aguiar
- na foto, Francisco Machado, Maria Aguiar e Edite Gil

- Em Oeiras, também, e no Parque dos Poetas, no dia 12, «O Espírito da Poesia», uma caminhada poética pelo percurso dos poetas. Respigo do folheto, «pequenos momentos mágicos e inesperados de uma criação artística livre... original, irreverente e lúdica». Espectáculo a cargo da COMPANHIADEACTORES, com concepção artística e direcção geral de António Terra, que me deixou absolutamente extasiado.

Apenas algumas imagens:




- No Fórum Cultural de Alcochete, no dia 14, La Farse Manouche, um trio de que já fiz referência, em tempos, constituído por adeptos «furiosos» do jazz de Django Reinhardt, de que me escasseiam palavras para medir a mestria. É procurá-los e ouvi-los!

- de cima para baixo, Nuno Serra, Alcides Miranda e Nuno Fernandes


Afixado por: Jorge Castro (OrCa) / 22:16


junho 12, 2008

des - esperança

por vezes só cardos
no país de rosas
por vezes um lastro
em redes de arrasto
e o chão que removes
em busca de restos
quando te comoves
tenteando um rasto

por vezes maus tratos
e sempre de rastos
tanta vez incertos
tanta vez concretos
e o resto que sabes
e quanto ignoras
de viver por perto
mas sempre por fora

por vezes o grito
que mais ninguém ouve
por vezes um dito
que talvez console
e o Sol e a Lua unidos num rito
que não acredito
que a ninguém assole

por vezes os fardos
que sempre carregas
por vezes os dardos
cravados nas vozes
por vezes só cardos
no país de rosas.

- poema de Jorge Castro

Afixado por: Jorge Castro (OrCa) / 08:35


junho 08, 2008

fotografando o dia (105)


quase tudo um reflexo
do chão por onde passamos
por vezes até faz nexo
ficarmos onde não estamos

e faz-se um mundo às avessas
por sermos quanto não somos
amontoado de peças
deste puzzle que compomos


- foto e poema de Jorge Castro

Afixado por: Jorge Castro (OrCa) / 09:02


junho 05, 2008

a festa continua... sequenciando raciocínios

Segundo a Agência Lusa, em 29 de Maio e eu ouvi-o, de viva voz, Jorge Pedreira, secretário de Estado adjunto da Educação, lançou mais uma pedrada no pântano, a propósito da avaliação dos professores: «Se todos puderem ser excelentes, o que está errado é a definição de excelência».

Nada mais preclaro!

Tanto que até me apetece parafraseá-lo, dizendo que se todos puderem ser secretários de Estado adjuntos da Educação, o que está errado é a definição de secretaria de Estado adjunta da Educação...

Ou, então, recorrendo às transcendências orientais e citando Paramahansa Yogananda - sediado nos States, claro, por razões mais terra-a-terra - lembraria que «o homem que separou a mente da alma, não pode manifestar um verdadeiro discernimento»...
...

Enfim, bojardas à solta, um Lello incontinente asneia sobre o Manel, poeta e Alegre, sobre visita insular. «Crítica» abstrusa, que acerta a anos-luz da verdade e que é prontamente desmontada pelos intervenientes, mas mais revela alguma dor de cotovelo (ou de alguma outra parte mais conspícua) recalcada.

Já José Vieira da Silva, ministro do Trabalho, tem problemas de léxico: não conhece, em sede de negociação, nem o termo «recuo», nem o termo «cedência». Só conhece o termo «negociação». O senhor ministro tem, portanto, confessadas incapacidades para o assunto, apenas se bastando em redundâncias.

...

Perante o despautério em impostos por parte dos governos - laranjas, rosas, azuis, às riscas, etc. - que já nos vem do tempo do Botas, com tal clamorosa incidência no preço dos combustíveis, uma espécie de Autoridade debruçou-se sobre as empresas para apurar se havia «cartel». Que não, que não! Aquilo é mais dos impostos, ora pois!

Para isto, foi preciso reunir uma Autoridade? Se calhar foi, pois o Manel Pinho logo se lembrou de que já se tinha lembrado, aqui há dois anos, de que giro, mas mesmo giro, para acalmar os descontentes, era pôr placas nas auto-estradas a anunciar os preços das três gasolineiras mais próximas. Determinante, como é estupidamente claro, para o controlo e, quiçá, abaixamento dos preços!

A tal Autoridade desempenhou, pois, apenas o elementar papel de post-it, amarelado e com margem autocolante ao poder, sob a forma de recordatório ao senhor ministro.

E pronto!

A sério, vocês não nos arranjam um PS um bocadinho melhor do que isto? É que este até já me sinto constrangido ao apresentá-lo às visitas...

Afixado por: Jorge Castro (OrCa) / 22:21


junho 01, 2008

foi bonita a festa, pá... estou contente!


Farândola do Solstício
- memórias de infância por terras de Miranda
.


apresentação do livro no Museu da Electricidade (Belém - Lisboa),
em 31 de Maio de 2008


Nestas coisas, as palavras são sempre demasiado redutoras para que valha a pena gastá-las, massacrando os demais e ficando, invariavelmente, a anos-luz da realidade... Quem lá foi, viu como foi!

Esplêndida a festa, com Trás-os-Montes trazidos ali à boca do Tejo. A sala, uma vez mais, cheia, pelo que devo deter-me para um agradecimento do tamanho do mundo a quantos me premiaram com a sua presença - e muitos foram!

Deixo-vos imagens do evento AQUI.

Quem estiver interessado em adquirir um exemplar, cujo preço de capa é de € 20, por favor, dirija-me uma mensagem nesse sentido para
jc.orca@gmail.com



E para quem tiver paciência, aqui fica o registo da minha apresentação do livro e do evento:

Boas tardes, meus amigos.

- O meu agradecimento à Fundação EDP, na pessoa do seu Director, Dr. Eduardo Moura, que teve artes de «descomplicar» o acesso a este magnífico espaço do Museu da Electricidade para o lançamento deste meu livro. Um espaço onde se trabalhou para haver mais luz; e onde se trabalha, ainda, para a luz do conhecimento, agora;

- o meu agradecimento, também, pelos apoios recebidos por parte:

- do IELT - Instituto de Estudos de Literatura Tradicional, no seu afã de manter viçosa a nossa tradição oral, para que não nos percamos de nós;

- da Câmara Municipal de Miranda do Douro, terra de quem me apraz mais e mais, em cada visita, ver-lhe a cara e sentir-lhe os ares;

- do Clube do Pessoal da EDP, pela divulgação do evento e disponibilidade para apoiar outras futuras apresentações, no Porto e em Miranda;

- mas, principalmente, de todos vós, pela vossa presença, uma vez mais, sem a qual nada disto faria sentido.

50 anos me levou este livro a fazer. Livro de memórias, daquelas com que os nossos olhos aprendem a ver o mundo. Não será, pois um exercício de rigor, mas, antes, um passeio pelos afectos.

Que raio de nome este! Farândola do Solstício!... Bom, Farândola, porque quer ser uma dança de rua, onde os bailadores se dêem as mãos, num cordão a perder de vista. Do Solstício, porque se pretende em sintonia com antigos rituais de celebração à Vida e ao seu sempre renovado recomeço.

Não será por acaso que uma das personagens das festas do Solstício de uma aldeia mirandesa se chama Farandulo de Tó…

Falo-vos nele de Miranda do Douro, da minha terra por afecto, na minha passagem por lá, entre 1956 e 1963, acompanhando os meus pais na edificação das três barragens hidro-eléctricas do Douro Internacional (Picote, Miranda e Bemposta).

Falo-vos das pessoas, dos bichos, das coisas, dos lugares que formaram os meus alicerces e que me ensinaram a viver. E trago-vos essas impressões num livro que é, desgraçadamente, um projecto eternamente inacabado… Quantas vezes o encerrei para, logo depois, lhe acrescentar o aprumo de um apontamento, mais corpo a um adjectivo desgarrado, ou uma segunda demão numa pintura menos nítida.

É, então, de algum modo, este o desafio que quero fazer-vos com esta Farândola: sirvam-se, à vontade, usando e abusando do exemplo, entendendo-o como um hino à Vida, lavrando disso testemunho. Recordem e partilhem as vossas histórias de vida. Cada um de nós irá mais seguro para o futuro, ciente do caminho que trilhou.

Do que vos falo no livro, vem de um tempo distante. Usando as palavras do Dr. Eduardo Moura, na sua apresentação da exposição «Rostos da Central Tejo», patente neste Museu, direi que este livro, tal como essa exposição, «sublinha as formas originais de gerar electricidade e acentua o contraste com as novas visões de geração, definindo a distância tecnológica, social e mental que nos separa desse tempo. Mas essa época tecnologicamente distante é, afinal e ainda, o tempo dos nossos pais. É um tempo com rosto encostado ao nosso…» onde o labor e as realizações conseguidas «de uma forma notável melhoraram a vida de todos». (fim de citação)

Vivemos um tempo em que querem alguns cultivar a glória exclusiva do efémero em oposição à busca eterna da Utopia. E caem nesse erro grosseiro de dar a Portugal a cara de um futebolista quando, na melhor das hipóteses – e com o respeito que o ser humano nos mereça – ele representará tão somente os nossos pés (e com chuteiras) ou, até, as nossas pernas… Importante essa parte anatómica. E haja pernas e pés para andar!

Mas nem só de pernas se faz esse andar. Faz-se de vontade, também! E de saberes! E de caminhos!

Arte, cultura, espírito, transcendência, ficam aonde e servem para quê? Assistimos, em doses maiores ou menores de anestesia, à tentativa de formatação dos cérebros por formatados poderes públicos e privados, que cultivam o cêntimo como filosofia de vida e a competição individualista como padrão único de actuação.

Tudo se submete ao mercado e o papão dos tempos modernos passou a ter nome: chama-se o Senhor Défice, que tem uma relação conjugal duvidosa com a Dona Especulação e vive às custas da Tia Indiferença...

Honra, dignidade, partilha, lealdade, ser solidário, a individualidade contra o individualismo, mas ao lado do «outro», essa riqueza que o ser humano detém em si, no culto pela diferença, essa que promove o sonho com o qual «o mundo pula e avança como bola colorida…», nada disso pode ser mensurável em euros.

Mas o mundo é mais e melhor do que isso e assim o devemos entender. É ele feito de todas aquelas minúsculas coisas que dão sentido à Vida: a papoila no meio do verde campestre, a urze que a intempérie fustiga, a cumplicidade empenhada de um amigo, um olhar a perder-se de amores, o riso claro de um pensamento à solta… Vejam lá o que para aqui vai de desperdício e de encargos, a favor do culto da Vida!

Será de um outro tempo e de uma outra lógica das coisas este livro que vos trago. Mas não me falem de saudades nem de passadismos! Falem-me, sim, de testemunho. Falem-me de alternativas, também. Pois nunca nada é opinião definitiva e a História não é um lastro, mas um trampolim para o futuro.

Também por isso, para a realização deste livro, quis contar com a nova gente e dar-lhe prioridade nas minhas opções. Nova gente a quem nós, os mais «antigos», devemos estender o testemunho nesta prova de estafetas em que todos participamos.

- Os criativos da TunalightZone (Alexandre Castro, Edgar Filipe e Gustavo Maia), responsáveis pela concepção da excelente capa e demais tratamento gráfico do livro,

- a tipografia Tipocasi, na pessoa do José Luís Pinto,

- os bravos Gaiteiros de l’Piara:

André Pires - Gaita de Foles Transmontana
Cláudia Coito - Percussão
Gonçalo Fabião - Percussão
Paulo Marinho - Gaita de Foles Transmontana
Pedro Calado - Percussão

que espantam e fazem reviver, com ancestrais sonoridades, estas antigas estruturas, que, também elas, estão, hoje e aqui, a fazer as vezes das duras e feras penedias transmontanas,

todos eles a darem-se as mãos com o

- CRAMOL, estas entranhadas vozes da terra-mãe que tanto me gratificam pela sua sonoridade, como me honram pela sua companhia; de quem direi, como José Mário Branco, que «não se pode compreender este país sem ouvir o Cramol… Cramol quer dizer "clamor". Mulheres que, como refere o texto de Domingos Morais, "amam e sofrem sem objecto visível". Devia ser obrigatório nas escolas. A revolução social de que precisamos também passa por aqui, pela evidência incontornável desta força.»

- com a amiga e editora Fernanda Frazão, da Apenas Livros, dos livrinhos de cordel… e dos outros, de quem conto já com tantas cumplicidades e aventuras, nesse imenso estendal de saberes e exemplo de atitudes que ela tem sido;

- com a minha madrinha de escritas, a Ana Paula Guimarães, cujo constante desassossego intranquiliza o mundo e com quem também aprendi a contrariar aquela quadra popular, começando a pagar, ainda em vida, o meu tributo à terra;

- e com os dois companheiros de caminhadas, Eduardo Mendes e João Pequito, nesta grande jornada que se iniciou na Hidro-Eléctrica do Douro e é prosseguida até às Energias de Portugal, sabendo-se lá onde parará…

- todos juntos, comigo e, agora, com todos vocês, também, viemos para a rua, nesta Farândola sem fim que é a Vida para, assim, cumprirmos dela mais uma etapa que se espera seja do vosso agrado.

Procurando sempre tudo o que nos possa unir nas nossas inevitáveis diferenças e desprezando o ruído de fundo de invejas, desatenções… ou alguma moleza de coluna dorsal.

Termino anunciando-vos que, simbolicamente, entendi que, por cada livro vendido, revertesse um euro a favor da Associação de Reformados da EDP/REN, instituição de solidariedade à qual, como é hábito que a todos transcende, não sobram recursos à sua obra meritória.

Por mim, não fazendo, pela ordem natural das coisas, contas de enriquecer com a literatura, é por ela que tenho, afinal, descoberto os caminhos para tantos tesouros escondidos e esses me vão bastando.

Se o pouco, quase nada, deste gesto - em que, afinal, dependo de vós, também - ajudar a desenhar um sorriso nalguma face lavrada de rugas, direi que mais um objectivo foi cumprido. Se esse gesto contribuir para o despertar de alguma consciência adormecida, com outros meios e poderes… então direi que o objectivo foi plenamente conseguido.

Com a Farândola é oferecido um exemplar do meu mais recente livro, Poemas de Menagem, livro integralmente patrocinado pela Junta de Freguesia de Carcavelos – a minha terra de acolhimento – a quem deixo, uma vez mais os meus agradecimentos, na pessoa da sua Presidente, Drª. Zilda Costa da Silva.

Resta-me sugerir-vos, colhendo as palavras do Presidente da Câmara de Miranda, Engº Manuel Rodrigo Martins que, logo, logo que possam, «Besitem Miranda de l Douro... un cachico de cielo na tierra». Sintam-lhe a dureza das fragas, saboreiem a suculência da posta, ouçam-lhe os sons ancestrais, contemplem o desenho dos lameiros, deixem o olhar perder-se nas lonjuras do planalto…

Bem hajam.

Afixado por: Jorge Castro (OrCa) / 16:36


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noites com poemas 2


capa do livro Farândola do Solstício
Obras publicadas
por Jorge Castro

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A Arquitectura das Palavras (Lupus Signatus)
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Arde o Azul (Maat)
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Cartas Perdidas (Alexandre Sousa)
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2 Dedos de Prosa e Poesia
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Erotismo na Cidade
Fôlego de um homem (Fernando Tavares)
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Humores (Daniel Aladiah)
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Letras por Letras
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Lus@arte (Luí­sa)
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Menina Marota
Novos Voos (Yardbird)
O Eco Das Palavras (Paula Raposo)
Porosidade Etérea (Inês Ramos)
O Sí­tio Do Poema (Licínia Quitério)
Odisseus
Paixão pelo Mar (Sailor Girl)
Palavras de Ursa (Margarida V.)
Palavrejando (M.P.)
Poemas E Estórias De Querer Sonhar
Poesia Portuguesa
Poetizar3 (Alexandre Beanes)
Serena Lua (Aziluth)
Sombrasdemim (Maria Clarinda)
Sopa de Nabos (Firmino Mendes)
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Uma Cigarra Na Paisagem (Gisela Cañamero)
Xanax (Susanagar)

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As Causas da Júlia
Cí­rculo de Poesia
Confessionário do Dilbert
Desfolhada (Betty)
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Fata Morgana... ou o claro obscuro
Jorge Moreira
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Poemas de Trazer por Casa e Outras Estórias - Parte III
Poesia Viva (Isabel e José António)
Poeta Salutor (J.T. Parreira)
Que bem cheira a maresia (Mar Revolto-Lina)
Sais Minerais (Alexandre)
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Sombra do Deserto (Rui)

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